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terça-feira, 18 de agosto de 2020

desejo e volúpia



quero penetrar com meu desejo

os poros da tua sensualidade.

quero abrir de par-em-par

a porta das tuas traseiras

e, ali dentro, fazer jorrar

o quente e fértil líquido

que ombreie com tua imoral volúpia

de bela e desejável mulher.

desnudar-te a pouco e pouco

e em tua pela nua depositar beijos,

e em tua pele nua depositar carícias, ardores e lascívias.

com o instrumento da volúpia

cravado bem no interior de ti

tomar-te em meus braços de poeta

e fazer-te sonhar com paraísos reencontrados.

ser o divino sacerdote do desejo e

na tua boca introduzir a hóstia da masculinidade.

com minha destra língua

levar-te à loucura e a exigires, desejosa,

a consumação da carnalidade,

e seres, assim, depositária do fulgor de nossos corpos.

e após, fiquem eles, assim irmanados,

em tréguas momentâneas, planejando e antecipando novos enlaces.

assim te quero sempre ver,

mulher

de coração selvagem e espírito alegre,

disposta a sorrir, contente, 

a cada mútuo desafio do amplexo carnal.

sexta-feira, 7 de agosto de 2020

DESENCONTROS


Parte I


Tu e Eu


Em mil visões levantinas

O meu varonil ofício exerço

Sem olvidar que limpar latrinas

É também mester que bem conheço


Se tens de te erguer dormindo ainda

Deixa que teu pé calque a terra

Arada pelo amor da manhã finda

Sob a lágrima que mundo soterra


Ergue tua palavra como mar de rosa

Afina e aguça o lápis da tua prosa

Reconstrói de Rhodes o imenso Colosso

E deixa o poema fazer-se puro e moço


Tece flocos de gelo ardente

Na Paris dos artistas luz e amantes

Bebe da vil e amarga aguardente

Até que tudo retorne ao que era dantes


Se precisão tiveres de um amante

Vozeia com tua dourada voz o meu nome

Até que todolo meu ser se alevante

E na Láctea Via só livre encontre teu renome


Companheiro teu também serei

Até que ser haver não hei

E sejas tu a chave-mestra

Do sistema métrico da pena alva e destra


Serei o altivo e orgulhoso mendigo

Do teu amor feminil sempre carente

E seja eu o anjo do mundo antigo

Em desgraça caído num mundo demente


Torno agora à casa que será ninho

Por herança do morgadio inexistente

E contigo conserte o dócil cadinho

De te amar total e tranquilamente


Dócil o cadinho de ternura tecido

Ditoso enlevo no vasilhame do amor vertido

Por mor do espanto de te ver mulher

E pera encanto de tudo o que vier

Amar-te sempre até morrer.


Retorno agora ao redil infernal

De ver alongar distância tua

No vigor ardente do calor estival

Como se nos apartassem Terra e Lua


Meu coração chora e fere-o a desdita

De não te ter inteira aqui e agora

Como ditosa seria a alegre hora

Em que a nossa carícia fosse bendita


Se minhas lágrimas te aprouverem

Do desfavor que de ti me fazes

Leva peço-te a tristeza que me trazes

Bem toda a angústia que me trouxerem


Que de tudo te livres onde aprouver

Do oiro e prata com que teu busto moldei

Que de humilde barro outro farei

Daquele grande amor que de ti restar


A minha perdição te é indiferente

Assevero-te no entanto, que gostarias

Na corrente do remanso dos dias

Veres-me a teu lado pleno e contente


Despeço-me agora amor de felífero odor

Continuarei ao longe acompanhando tua jornada

De holofotes patine e lantejoulas trajada

E para sempre ignorante do meu amor.


Parte II


O vazio da alma


E agora? E se agora, tresloucada, risse

Desperta do sono penumbra da inacção

Despida do ardor de qualquer intenção

Pelo olhar do hiperbóreo oculto visse


Compreenderias o que não posso dar?

Sentirias o quão sôfrego de amar

Vivo desde sempre sem empatia

A voz silente do luar do meio-dia?


E viverias como o sopro de um princípio

Um livro verde uma agenda e a fuga

Lentamente declinando os tempos como ofício

Como quem de mim a vida purga


Parte III


O pas-de-deux e o Horror


Hoje de todas as desesperanças o dia

Encontro-me a sós com as palavras

Promessas de amor desejo e alegria

No final difícil e atribulado da jornada


Qual desatino de meu ser antagónico

Predador de mim e humor sardónico

Empurra-me para a lembrança da tempestade

Que se avizinha solitária e desoladora beldade


De me ver sendo sem de mim existir

No quebranto da luz velada do desamor

E entretanto até à morte de subsistir

Isento de imposto por foça de ser menor


Neste testamento de fotografias enlaçadas

Do duro ofício de existir à beira-mágoa

Percorro o rio caudaloso de alta frágua

Do caminho percorrido sob vossas alçadas


Que se dane o enlevo e a fera felicidade

Esparçamente por mim encontrada nesta idade

Filha do desgosto e da amargura existente

Da clara consciência de estares sempre ausente


As palavras vão e vêm no amplexo do dia longo

Desta insana consciência de existir correndo

Caindo sobretudo e levando por certo este corgo

De uma vida infeliz passada obedecendo


Atiro a caneta para fora do meu alcance

Desejoso de nem mais uma linha escrever

Sabedor da adicção do permanente enlace

De sentido metaforano que implica o mester


Alma perdida no tormento da borrasca

Molhada até aos ossos da minha fundura

Desejoso da redenção do que de mim só casca

Do medo do futuro que imóvel perdura


Escrevo estas linhas como quem se mutila

Na dor da vida passada sem carinho

Olvidando o amor que permanente vacila

Do nada venho e para o nada caminho.


Parte IV


O ódio que se vai soltando


Quando tudo o que é raso e sem sentido

Nos faz ponderar sobre o significado da virtude

E todo o bem que a muito custo é vivido

Nos faz alcançar tudo o que é vã e fútil atitude


O ódio desprende-se lentamente do fundo da bandeira

Assim feio e desonesto cobarde e por isso vil

O nauseabundo odor a pútrida cegueira

Campo mar e céus preenche com seu ardil


Se a confusão dos símbolos é intenção

Se o derrube da liberdade se ergue impante

Tomando a baba vomitada do ódio como canção

Que fazer senão arremeter contra o flagrante


Apenas todas as palavras serão suficientes

Para fazer deste ódio carniceiro e celerado

Algo mais que um mero final acertado

E finalmente fazer da corja horrores ausentes


Por enquanto perdemos em época de baixas esperanças

Perdemos o norte perante o assalto dos fanáticos

Fanáticos que cônscios nada têm de lunáticos

Ímpios nos pretendem ferir com suas lanças


Resta apenas resistir homens de boa vontade

Ao arremesso das flechas com opróbrio lançadas

Contra a armadura que levantada nos invade

Da liberdade igualdade e fraternidade a nós dadas


Não desespereis no entanto com este desnível

Já outras lutas pelas eras corajosos travámos

Até que altivos sonhadores da Utopia transformámos

Derrotas certas na Vitória arrancada ao impossível


Parte V


Conjugações


É este rol de versos conjugados

Da fome de pão, de amizade, de amor

Que no balanço dos tempos passados

Dê início à recidiva da oculta dor


Anos bastos de orgulho vida e morte

Pespegados no caixão da mundana sorte

Em estranho mundo fundados entrem

E do cruel cativeiro livres se soltem


Qual criança em terra estranha caminho

Na absoluta desesperança de aqui não seres

E sentir ao largo o luto de aqui não estares

Nesta jornada ilustre em que pelejo sozinho


Vai agora e que te a esperança leve

De não me saber fecundo ou oculto

Terra chão que qual deusa me persegue

E que de troça e opróbrio me faça inculto


De luta e peleja bastante sabedor

Interior ignoto a que sempre regresso

Aumenta pois esta vida em ditosa dor

Por que minha vitória dos Anais seja sucesso


Digo sim e sim novamente a toda a derrota

E de punho erguido buscando a glória

Vou de batalha em batalha em ditoso recomeço

Que de meus feitos fique repleta a História


Até a morte última companheira sobrevir

Continuarei orgulhosamente cantando

Esta estória minha obra do porvir

E verseje a esmo com o que vida vá roubando


E embora viva de desnorte em desnorte

Pisando terra firme que o Sol alumia

Cantarei ufano a minha vitória um dia

No silêncio das eras e que os deuses conforte


Estando derrota e vitória já conjugadas

Dou por ora findas estas jornadas

De sémen suor e sangue entretecidas

De rasgo e perigo feitas vidas adormecidas